No dia das mães nós vamos falar das Aias, as mulheres que, no mundo criado pela Margaret Atwood, eram forçadas a ter um filho após a outro e existiam exclusivamente para procriar. Elas eram mães, portanto o dia de hoje também é delas, mas eram um tipo bem diferente: mães escravizadas, que não tinham tempo nem condições de idealizar a maternidade, nem de criar laços com os filhos que não desejavam ter. Eram verdadeiras máquinas de parir. Vale à pena visitar o mundo delas e refletir sobre ele.
Sinopse do livro
A história de "O conto da aia", da canadense Margaret Atwood, passa-se num futuro muito próximo e tem como cenário uma república onde não existem mais jornais, revistas, livros nem filmes ? tudo fora queimado. As universidades foram extintas. Também já não há advogados, porque ninguém tem direito a defesa. Os cidadãos considerados criminosos são fuzilados e pendurados mortos no Muro, em praça pública, para servir de exemplo enquanto seus corpos apodrecem à vista de todos. Para merecer esse destino, não é preciso fazer muita coisa ? basta, por exemplo, cantar qualquer canção que contenha palavras proibidas pelo regime, como "liberdade". Nesse Estado teocrático e totalitário, as mulheres são as vítimas preferenciais, anuladas por uma opressão sem precedentes. O nome dessa república é Gilead, mas já foi Estados Unidos da América.
Como tudo pôde mudar tão rapidamente? Offred, a narradora, responde: "Foi depois da catástrofe, quando mataram a tiros o presidente e metralharam o Congresso, e o Exército declarou estado de emergência. Na época, atribuíram a culpa aos fanáticos islâmicos. Mantenham a calma, diziam na televisão. Tudo está sob controle. (...) Foi então que suspenderam a Constituição. Disseram que seria temporário. Não houve sequer um tumulto nas ruas. As pessoas ficavam em casa à noite, assistindo à televisão, em busca de alguma direção. Não havia mais um inimigo que se pudesse identificar." Não, este não é um romance pós-atentados terroristas de 11 de setembro de 2001. Margaret Atwood, a grande dama da literatura contemporânea em língua inglesa, publicou-o originalmente em 1985. O livro já é um clássico, há muitos anos adotado nos colégios ingleses, canadenses e americanos.
E agora ganha tradução para o português.As mulheres de Gilead não têm direitos. Elas são divididas em categorias, cada qual com uma função muito específica no Estado ? há as esposas, as marthas, as salvadoras etc. À pobre Offred coube a categoria de aia, o que significa pertencer ao governo e existir unicamente para procriar. Uma catástrofe nuclear tornou estéril grande parte das pessoas, de modo que as mulheres férteis agora são preciosidades. Transformadas em aias, elas são entregues a algum homem casado do alto escalão do exército e obrigadas a fazer sexo com eles até engravidar. Portanto, a cada mês, menstruar é fracassar. E quando elas engravidam, dão à luz e amamentam a criança por alguns meses, sendo que o bebê é propriedade do casal que as escravizou. Após o período de amamentação, elas são entregues a outro homem e passam pelo mesmo martírio novamente, agora com outro nome ? Offred é "of Fred", "de Fred", "pertencente ao homem chamado Fred". Ao longo da vida, uma aia pode ter vários donos e, portanto, vários nomes: Ofglen, Ofcharles, Ofwayne...As aias são controladas e vigiadas dia e noite.
Elas não têm permissão para escrever nem ler, só podem ir ao banheiro um determinado número de vezes por dia e não devem permitir que nenhum homem veja qualquer parte do seu corpo exposta, nem mesmo os braços. O ideal é que nem seu rosto seja mostrado.
É uma vida triste, mas um destino melhor que o das não-mulheres, como são chamadas aquelas que não podem ter filhos, as homossexuais, viúvas e feministas, condenadas a trabalhos forçados nas colônias, lugares onde o nível de radiação é mortífero.Offred tem 33 anos. Antes, quando seu país ainda se chamava Estados Unidos, ela era casada e tinha uma filha. Mas o novo regime declarou adúlteros todos os segundos casamentos, assim como as uniões realizadas fora da religião oficial do Estado.
Era o caso de Offred. Por isso, sua filha lhe foi tomada e doada para adoção, e ela foi tornada aia, sem nunca mais ter notícias de sua família. É uma realidade terrível, mas o ser humano é capaz de se adaptar a tudo. Offred escreve em seu diário proibido: "A sanidade é um bem valioso: eu a amealho e guardo escondida, como as pessoas antigamente amealhavam e escondiam dinheiro. Economizo sanidade, de maneira a vir a ter o suficiente quando chegar a hora."Com esta história assustadora, Margaret Atwood leva o leitor a refletir sobre liberdade, direitos civis, poder, a fragilidade do mundo tal qual o conhecemos, o futuro e, principalmente, o presente. O conto da aia já foi transformado em filme, peça de teatro, ópera, audiolivro e dramatização radiofônica.
A história pode ser criada, mas acredito que isso realmente acontece em muitas partes do mundo. Quantas mulheres ainda nao sao submetidas a condicoes desumanas e sao utilizadas apenas com fim reprodutivos?
ResponderExcluirTempos atrás, um conhecido me falou que durante a segunda guerra na Romênia (também mergulhada em um regime ditatorial) muitas mulheres que trabalhavam fora eram despedidas de seus empregos e presas. Seus crime?? Nao estar grávida!! Nao "produzir" soldados para o regime. Tentei por várias vezes encontrar registros sobre esse episódio. Nao encontrei!!
ResponderExcluirMuito se esbraveja contra o controle de natalidade na China. O controle lá é necessário, mas concordo que os métodos utilizados como esterelizacoes e abortos forcados é uma afronta aos direitos humanos.
Porém, a maternidade forcada parece, pelo menos aos olhos da sociedade, mais "aceitável" ou um crime nao "tao grave".
Quando se nega o acesso aos métodos contraceptivos ou servicos de saúde que permitem uma mulhere controlar sua fertilidade é, aos meus olhos, um crime tao brutal quando um aborto forcado!!!
Cara Nicole,
ResponderExcluirmuito bom o seu texto e a sua análise ... aproveito a oportunidade para lhe informar que este livro foi transposto para o cinema... em Portugal chamou-se A História de Aia é do director Volker Schlöndorff.