Hipátia de Alexandria, matemática e filósofa grega, nascida aproximadamente em 355. Filha de Theon, um renomado filósofo e matemático que também era seu professor e que foi o responsável por despertar e estimular o seu interesse pela Matemática, Astronomia, Filosofia, Poesia, Retórica e Oratória.
Hipátia completou os seus estudos na conceituada Academia Neoplatônica em Atenas e ao voltar para Alexandria conquistou o posto de professora na Academia onde havia estudado boa parte de sua vida. Logo se tornou a diretora da Academia, e estudantes de várias cidades, e até de outros países, fossem cristãos ou pagãos, enfileiravam-se nas salas de aula da biblioteca da cidade para assistir às suas aulas.
Hipátia recusou propostas de casamento e renunciou à maternidade para se dedicar ao aprendizado e ao ensino. É sabido que ela desenvolveu estudos e escreveu um tratado sobre a Álgebra, além de ter escrito comentários sobre matemáticos clássicos e de ter se empenhado em solucionar problemas matemáticos confusos e questões astronômicas.
Em março de 415 Hipátia foi assassinada por um grupo de cristãos fanáticos que a acusavam de bruxaria. E foi assim porque Hipátia não era uma mulher comum, e o fato de ela não ter sido uma mulher comum, mas sim educada, decidida e independente demais para sua época, abriu espaço para que algumas pessoas se sentissem intimidadas por ela. O que, por sua vez, abriu espaço para especulações e falsas acusações. Mas o que poderia estar errado na vida de Hipátia? Ela não havia casado, não havia parido uma penca de filhos, nem servido aos homens até o fim de sua vida. Pelo contrário. Hipátia era respeitada pela sociedade e ouvida pelo prefeito da cidade que a tinha como uma conselheira e a quem recorria com freqüência antes de decidir como proceder em relação aos problemas que a Alexandria enfrentava naquela época.
Hipátia escolheu ser dona de si, senhora do seu destino, e isso simplesmente não fazia sentido na cabecinha dos cristãos de outrora (e pra ser sincera ainda não faz, na cabeça de muitos de agora).
Uma mulher influenciando a decisão de um homem? Uma mulher que faz o prefeito pensar e pesar conseqüências ao invés de agir baseado no que está escrito nas escrituras bíblicas? Uma mulher que impede que o prefeito faça o que “a gente” quer? Precisamos nos livrar dela. Digo, uma mulher dona do seu tempo, da sua vontade, do seu corpo, do seu presente e futuro? Isso não é coisa de deus, afinal é deus quem deve escolher o nosso destino. Cabe a ele nos guiar, quando quiser e se quiser... e nos resta apenas crer e esperar que ele haja -- diziam os cristãos. É ele quem deve enviar o “homem certo”, com o qual a mulher casará e terá quantos filhos deus desejar. Ouça bem: quantos filhos deus desejar e não a mulher. Afinal de contas, quem é ela para dizer que não quer mais parir? Quem dirá para dizer aos quatro ventos que não quer e que nunca irá parir. Se ela vive do jeito que bem entende, se recusa a viver de acordo com a palavra de deus, e ousa influenciar um homem que está no poder, então isso deve significar que ela também tem algum poder. (E é claro que eles ignoraram que esse poder era a inteligência, a capacidade de raciocinar, refletir e discernir o certo do errado, capacidade essa que ela havia aprendido e praticado durante todos aqueles anos em que se dedicou aos estudos.) Mas é claro! Ela deve ser uma bruxa! Sim, ela é uma bruxa, está decidido. Uma bruxa e das mais perigosas! O que quer dizer que devemos fazer alguma coisa para evitar que essa mulher continue influenciando o prefeito, digo, desafiando a palavra de deus. Mas que palavra é essa? Não importa, está na Bíblia, em algum lugar, eu sei que está, e por isso devemos segui-la. Mas o que é que deus diz que devemos fazer em casos como esse? Ele disse que devemos puni-la. Que devemos impedir que ela continue vivendo assim, no pecado. Vamos matá-la. Isso, vamos matá-la para ensinar às outras mulheres que aqui não é a casa da Mãe Joana não senhora, vamos dar uma lição nessa turma.
Cercaram Hipátia quando ela voltava para casa após um dia inteiro ensinando seus pupilos a pensarem com a própria cabeça e não com a cabeça dos outros, ou segundo à “palavra de deus”. Suas roupas foram rasgadas do seu corpo e Hipátia foi arrastada pelas ruas de Alexandria até a Igreja Cristã mais próxima onde ela foi apedrejada, ou queimada (as referências históricas divergem nesse ponto), mas não antes de ter sido descamada como um peixe -- teve sua pele arrancada ainda viva com o uso de conchas de ostras afiadas que deslizaram nada suavemente sobre suas curvas até que não existisse nada além de carne vermelha, a ser cortada em pedaços e espalhada pela cidade, como foi.
O crime de Hipátia foi ser corajosa e forte o suficiente para decidir que cabia a ela definir quem ela gostaria de ser e como ela gostaria de viver a sua vida. Ela escolheu o seu próprio rumo ao assumir a paixão de aprendiz e de professora, renunciando a uma vida de dona de casa, de submissão a um marido e de cuidados maternos. Hipátia decidiu que ela viria em primeiro lugar e que o seu desenvolvimento seria sua prioridade. O crime de Hipátia foi ousar ser Hipátia.
Nicole Rodrigues
O filme "Ágora", de Alejandro Amenábar, conta a história de Hipátia.
Fontes:
O filme "Agora" de Alejandro Amenábar
http://en.wikipedia.org/wiki/Hypatia
http://pt.wikipedia.org/wiki/Hip%C3%A1tia
A história humana está repleta de crimes covardes como este. Infelizmente homens usam a religião como forma de justificar seus atos hediondos e manter um conceito ridículo de submissão e exploração da mulher. Hipátia é um símbolo da força e da coragem e deve ser lembrada como alguém que preferiu a liberdade e o conhecimento ao invés da dependência e da humilhação.
ResponderExcluirAbraços!
Alex,
ResponderExcluirAs palavras benditas do teu blog "Sempre os que dizem de antemão que lutam em nome de Deus são as pessoas menos pacíficas do mundo: como crêem que recebem mensagens celestiais têm os ouvidos surdos para qualquer palavra de humanidade.” (Stefan Zweig) explicam o que te trouxe até aqui. Seja muito bem-vindo nesse útero vazio, onde sempre cabe mais um.
:)
Desculpe ser tão impertinente, mas adorei este espaço. Aqui as mulheres não são apenas objetos de desejos, mas pessoas dotadas de muita inteligência. Admiro muitas mulheres com personalidades marcantes: Joana D’Arc, Olga Prestes, Simone Weil, Florbela Espanca, entre outras. E apaixonei pela história de Hipátia, a qual não conhecia. Em breve iria assistir ao filme recomendado, Ágora.
ResponderExcluirGrande abraço!
Oi.
ResponderExcluirÉ interessante o amor dela pelo conhecimento e a sua modernidade feminina; o filme soube retratar muito bem a história. Vale recomendar o filme.
Abraço.
Desculpe-me novamente a impertinência, mas ao assistir “Ágora”, lembre-me de outro filme sobre o absurdo da religião cristã contra as mulheres. O filme em questão trata-se do chocante “Em Nome de Deus” (The Magdalene Sisters) de Peter Mullan. O longa-metragem é sobre Os Lares Madalena,na Irlanda, lugares de responsabilidade da Igreja Católica, onde jovens mulheres eram mandadas pelas famílias ou pelos orfanatos e lá obrigadas a trabalharem na lavagem de roupa, sofrendo todo tipo de castigo: humilhações, abusos e estupros. Vale à pena conferir.
ResponderExcluirAbraços
Olá.
ResponderExcluirFazendo umas pesquisas encontrei este blog. Sobre o texto, deve ter sido mesmo admirável a produção intelectual de Hipatia em sua época, e triste seu fim. Mas gostaria de salientar algumas informações e contextos omitidos, e citar algumas de suas palavras para melhor referenciar as minhas, mas não é possível copiar seu texto aqui. :(
Bom, primeiro que esses "cristãos", se de fato a mataram, não são dignos de serem chamados assim. Você diz sobre Deus que "ele diz que devemos puni-la", supondo acerca do pensamento deles, mas, pelo contrário, Jesus sempre combateu a hipocrisia dos mestres da Lei que buscavam matar qualquer um, e Ele impediu que a mulher adúltera (que era condenada pela antiga Lei, então vigente) fosse apedrejada. Não é estranho pensar que Ele mandaria matar outra só porque estudava e era influente? Mas infelizmente, muitos cheios de ódio só veem o que lhes convém, e muitos tmb matam e violentam com ações e palavras em nome de ideais, liberdade e virtudes. Se aqueles se diziam cristãos, não o eram realmente. Quanto à Grécia, ela mesma sobrepujava as mulheres ao homem. As mulheres (mesmo casadas) poderiam ser tomadas (violentadas) por outros homens em plena luz do dia, caso ela o 'agradasse'(!!), e depois devolvidas ao marido. A prostituição e a poligamia eram normais, e o papel da mulher, mesmo sendo ela pouco mais ouvida, não era de igual ao homem, apesar do que se ilustra por aí. Infelizmente a violência não se limita à religião, crença ou cultura alguma, está no coração caído do homem. Sobretudo na antiguidade... Segundo o conceito de impiedade da Grécia Antiga, que " tornava réu quem não acreditasse nos deuses da pólis ou quem pregasse algo em desacordo com a crença vigente" (inclui-se aí a suposta bruxaria de Hipatia e/ou possíveis pensamentos filosóficos que poderiam ser contrários à religião grega), e que era punido com morte, é possível que ela tenha sido alvo da própria lei grega e outros grupos se uniram no massacre (há de se imaginar, como sabemos das multidões que iam aos apedrejamentos e enforcamentos), talvez sim, talvez não. Ou seja, sempre ouve perseguição à liberdade de pensamento no mundo Antigo, viesse de quem viesse, assim como hoje muitos intelectuais que alguns poem como perfeitos, mostram-se tão intolerantes quanto um religioso medieval, apenas invertendo o alvo.
Att.