terça-feira, 27 de dezembro de 2011

Lionel Shriver


 "For me, establishing myself as a writer was so important, and took so long, that it consumed my entire reproductive lifetime... I didn't feel I could afford the distraction and emotional energy that it would have taken to try and raise a family at the same time."


“Para mim, me estabelecer como escritora era tão importante, e levou tanto tempo, que consumiu toda a minha fase reprodutiva... Eu não senti que eu conseguiria arcar com a distração e energia emocional necessárias para tentar e cuidar de uma família ao mesmo tempo.”


Lionel Shriver
Escritora americana

quarta-feira, 14 de dezembro de 2011

Mae West



"I never wanted children. I thought it would change me - mentally, physically and psychologically. I was always too absorbed in myself and I didn't have time for anybody else. I was talked into marriage once and maybe it was a good thing--I might have gotten married 10 times if I had been free all those years. But you know, a woman becomes a different person when she gets married. She lives for her husband and her family. I wanted to live for myself."

"Eu não quis ter filhos. Eu achava que isso mudaria quem eu sou - mentalmente, fisicamente e psicologicamente. Eu estava sempre tão absorta em mim mesma que não tive tempo para mais ninguém. Eu fui convencida a casar uma vez e talvez tenha sido bom - já que eu poderia ter casado umas 10 vezes se eu estivesse livre todos aqueles anos. Mas, sabe, uma mulher se transforma em uma pessoa diferente quando ela casa. Ela vive para o marido e para a família. Eu queria viver para mim mesma." 

Mae West
Atriz e roteirista americana

Tradução: Nicole Rodrigues

segunda-feira, 28 de novembro de 2011

Quando os avós viram pais


Texto: Com a crise, avós espanhóis sofrem estresse por excesso de responsabilidade com netos

Autora: Anelise Infante

Cuidar dos netos pode ser um prazer, mas também um problema. Um relatório espanhol indica que, desde o início da crise econômica em 2009, o número de avós que passaram a cuidar dos netos para ajudar o bolso dos filhos aumentou 47%. E, com isso, subiu o nível de estresse entre os mais velhos.

Patologias como ansiedade e depressão foram detectadas por excesso de responsabilidades no estudo Avôs e avós para tudo - Percepções em relação à educação e cuidado dos netos, apresentado recentemente pela Fundação Obra Social Caixa Madri.

Diante dos cortes de gastos dos pais com creches, atividades extraescolares e babás, os avós viraram serviços de primeira necessidade. Assim, 50% dos maiores de 65 anos na Espanha cuidam de seus netos diariamente; 45% o fazem todas as semanas.

Essa responsabilidade quintuplicou em menos de uma década. Em 1993, apenas 9,5% dos avós tinham a tarefa de ocupar-se dos netos. Atualmente, duas em cada três famílias apelam para o que os sociólogos definem como "avós-pais" ou "avós-babás".

Em outros países, como a Grã Bretanha, uma de cada quatro famílias recorre aos avós para o cuidado das crianças.

O problema, segundo o informe, é que na Espanha "estão ocorrendo muitos casos de abusos".

'Angustiados'

Há avós que precisam eles mesmos de cuidados e que afirmam que se sentem "angustiados e utilizados por filhos que lhes delegam excessiva responsabilidade no cuidados dos netos".

"Por um lado, reivindicam seus direitos de serem avós, não educadores. Demandam que haja limites em relação as suas obrigações, porque existe um temor de interferir nas estratégias educativas dos pais. Não sabem se aplicam seus critérios ou os dos seus filhos", disse à BBC Brasil o coordenador da pesquisa e psiquiatra, Eusébio Megías.

"E, por outro, temem que depois de cuidar de filhos e netos durante toda a vida, ninguém se preocupe por cuidar deles, acrescentou ele."

"Por um lado, reivindicam seus direitos de serem avôs, não educadores. Demandam que haja limites em relação as suas obrigações, porque existe um temor de interferir nas estratégias educativas dos pais. Não sabem se aplicar seus critérios ou os dos seus filhos "

Eusébio Megías, coordenador da pesquisa e psiquiatra

Segundo as conclusões do relatório, os avós se sentem divididos entre o prazer de passar tempo com seus netos e os excessos de exigências de seus filhos nestas tarefas.

Nestas circunstâncias estão aumentando as consultas médicas por estresse, ansiedade e depressão, de acordo com as estatísticas da Sociedade Espanhola de Geriatria e Gerontologia (SEGG) feitas para o Ministério da Saúde.

Para a SEGG, "o fato de 50% dos maiores de 65 anos dedicarem em média seis horas por dia de maneira forçada ao cuidado dos netos, negligenciando suas próprias necessidades, está causando problemas nervosos, porque muitos avós se sentem sobrecarregados".

Cultura e expectativa de vida


Além da crise econômica, o aumento da expectativa de vida e a cultura de ajuda familiar também são fatores que colocam os avós espanhóis nesta nova realidade de educadores por imposição. As espanholas lideram os índices europeus de expectativa de vida, com 84,9 anos, sendo que a média continental é de 82,4; entre os homens espanhóis, 78,7 contra 76,4 anos de média na Europa) .

Ao contrário de vários países ocidentais europeus, 56% dos espanhóis acham que os parentes devem ser a primeira opção na hora de pedir apoio financeiro e ajuda com o cuidado de algum integrante da família.

A taxa cai para 20% na França, 32% na Alemanha e não chega aos 10% nos países escandinavos.

"(Isso ocorre) provavelmente porque nestas sociedades há mais ajuda social. A questão é que, na Espanha, os avós passam mais horas com os netos do que a média europeia. Aí se produz um desajuste", afirmou à BBC Brasil a investigadora Maria Teresa López.

Paulino Castells, autor de 'Queridos Abuelos', diz que, se avós 'fizessem greve, país entraria em colapso'

Professora de Economia Aplicada da Universidade Complutense de Madri e co-autora da pesquisa Dupla dependência: avós que cuidam de netos na Espanha, López disse que os idosos são os mais adequados para substituir os pais no cuidado de netos, mas com pré-condições.

"Precisam de agradecimento pelo esforço, que os filhos não abusem de suas possibilidades e que as pautas de atuação sejam negociadas, porque eles devem ter suas necessidades também atendidas e valorizadas."

O psiquiatra Paulino Castells, uma das maiores autoridades nacionais no assunto com 18 livros publicados, acredita que o papel dos avós nos tempos de crise é tão importante que, "se fizessem greve, o país entraria em colapso".

O psiquiatra e avô de três netos disse à BBC Brasil que "está havendo uma mudança hierárquica. Pais que procuram refúgios no lar da infância e se transformam em irmãos mais velhos de seus filhos. Isso é um erro".

Fonte da imagem: http://projectcyrano.blogspot.com/2011/05/avos.html
Fonte do texto: http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2011/11/111125_espanha_avos_ai.shtml

sábado, 12 de novembro de 2011

Qual o sentido da maternidade, para as maternidades?

A maternidade traz consigo tanta bagagem. Tantos desafios físicos, psicológicos, emocionais e financeiros que é absurdo submeter as mulheres grávidas ao desafio do (des)atendimento médico em pleno dia de parto. Será que já não chega o medo, a ansiedade, o nervosismo, a expectativa e o desconforto que naturalmente serão sentidos nesse dia e nos 9 meses que o antecederam? Para quê infligir mais dor a quem se encontra em uma situação tão vulnerável e potencialmente perigosa? Que enfermeiras e médicas são essas que dão às costas à ética e à essência da profissão que escolheram e usam as ferramentas de alívio e cura para ampliar o sofrimento de mulheres que contam com elas em um dia tão importante?

É nossa obrigação denunciar todo e qualquer destrato sofrido por nossas irmãs, primas, sobrinhas, tias, mães, filhas e amigas. É nosso dever cuidarmos uma das outras. É nossa responsabilidade não fechar os olhos para o sofrimento alheio. E com isso, querida uterinas, só temos a ganhar. Por que se não cuidarmos umas das outras, quem cuidará?



Texto: Qual o sentido da maternidade, para as maternidades?
Autora: Rosana Antonio

Foi a primeira pergunta que me fiz ao entrar na Maternidade Alfredo da Costa(MAC) no dia 05 de Junho de 2009.

Minha bolsa rompeu em casa mais ou menos às 20h do dia 05 de Junho. Uns trinta minutos depois cheguei na MAC, onde fui atendida pela enfermeira de plantão.

Eu tinha sonhado com esse dia, esperava algo do tipo: “Olá, então chegou a sua hora?” Mas na verdade fui recebida com um: “Dispa-se e deite-se.”
Pediu também as minhas análises e com elas ficou se abanando como se estivesse na menopausa. Em seguida perguntou: “O pai do bebé é conhecido?” Pensei: “Pra quem?” Mas respondi: “Sim.” Ela continuou as perguntas... “É branco?” Eu, sem entender disse: “Como?” Ela continuou... “É branco?, cigano?, indiano? africano?” Respondi: “Branco.”

Na mesma sala, entrou uma colega fazendo um comentário xenófobo sobre uma mulher negra que tinha acabado de sair dali:

“E agora, o que ela fez com a escurinha?” A Sª Enfermeira que me atendeu lançou mais um comentário xenófobo: “Sabe-se lá, parece que foi falar com ela. Esta ai é mesmo a boa samaritana.” As duas enfermeiras protestavam a gentileza e a amabilidade da recepcionista com as grávidas naquele dia.

A colega continuou ali falando com a enfermeira que estava me atendendo. Esta quando me viu despida veio em minha direcção e fez um toque violento.

Quando ela terminou, desceram uns dois litros de água pelo chão. Ela disse-me: “O filha, respira para parede, não tenho eu que levar com isso. Levanta-te e comece a caminhar até chamarem-na para o quarto.” Em seguida, gritou: “Auxiliare, venha limpar mais uma porcaria”. Eu achei tudo muito macabro, mas a Leticia estava chegando e eu estava feliz.

Uns 20 minutos depois chamaram-me para o quarto 6. Minha mãe chegou meia-hora depois, o que me deixou muito mais tranquila. Estivemos ali, ela a consolar-me pelos toques que faziam de hora em hora, mas nenhum deles, foi como o da Srª Enfermeira que me recebeu. Eu a perder água sem parar, e nada de dilatação, mas tinha um consolo, duas enfermeiras que pareciam não fazer parte da equipa da maternidade.

Amélia e Sónia, foram super gentis. Chegavam, faziam um toque normal e diziam: “Vamos Rosana, queremos fazer o seu parto, e será aqui neste quarto que a Leticia vai nascer.”

No dia seguinte, iniciaram a prática para induzir as tais contracções. Elas começaram logo, mas a dilatação era lenta. Avisavam-me sempre dos centímetros que aumentavam e ao quinto ou sexto chegou a médica para fazer a epidural. Por cinco minutos não senti mais as dores. Bom demais para ser verdade. Pois é. Em seguida, comecei a sentir uma dor fortíssima do lado direito mesmo no “pé da barriga”. Depois de sentir a tal dor mais umas duas horas, volta a anestesista. Esta, se apercebeu que tinha ficado uma “janela aberta”. Foi esta a sua expressão. E mais: que não poderia mais mexer na minha coluna. Bem, fiquei ali com esta tal “janela aberta” que mais parecia “a porta do inferno”.

Aos 10 cm de dilatação e quase 24 horas de trabalho de parto, entra a Drª Graça e uma grande equipa, a mesma que passava por lá a cada hora para fazer o toque. Depois de muito tempo ela percebeu que o parto não poderia ser normal. Então começou a falar com a equipa sobre um parto a “ventosa”. Perguntei o que era o parto a ventosa, ela não quis dar nenhuma explicação dizendo que sabia o que estava fazendo.

Minha mãe insistiu, dizendo que precisava avisar ao pai da criança. Naquele momento, Drª Graça pediu que acompanhassem minha mãe a recepção e que me levassem para a sala operatória. No elevador, escutei os comentários e a ira da Drª Graça, que dizia: “Como assim, avisar o pai da criança? Se quisessem explicações médicas, deveriam ter ido para uma clínica privada. Sei eu o que eu faço, não devo dar explicações.”

Achei o comentário desprezível, ainda mais tratando-se da “melhor maternidade do país”.
Eu, tentando ser simpática, em meio as tantas dores e preocupada com o humor da Drª Graça, que iria fazer o meu parto, disse: “Srª Drª Graça, minha mãe teve uma péssima experiência com o método forceps, é só isso. E o que ela pretendia era perceber que processo é este que vão usar comigo.” Ela não deu respostas.

Entramos na sala e a mesma anestesista me fez mais uma dose no cateter. No mesmo instante, a Drª Graça começou a discutir com a colega se fazia a ventosa ou a cesariana. Uma dizia para fazer a cesariana, outra dizia que já não dava mais e que fizessem logo a ventosa. Eu, em pânico, disse: “Mas me parece que vocês não estão de acordo.” Esta minha frase deixou a Drª Graça e a anestesista furiosas. Esta última disse que não ficava mais ali e realmente, fez a sua dose e foi embora. E a Drª Graça disse que a vontade que tinha, era de não fazer o parto. Ficaram discutindo o tempo todo. A Drª Graça se sentia ofendida e não conseguia esconder, perdeu mais uma vez o controle e, quando retirou a Leticia, disse: “Berra Leticia, se não a sua mãe vai fazer queixas de nós.”

Olhei para minha filhinha tão linda e indefesa e pensei: “Meu Deus, como pode uma médica dizer a uma criança para berrar.” Vivi em quatro países antes de Portugal, e em nenhum deles as crianças berram. Esta expressão é usada para referir-se aos animais. Mas parece que, para a Drª Graça, é também usada para as crianças, em Portugal.

Em silêncio, pedi desculpas para minha filhinha, que ela aguentasse firme e que muito em breve, sairíamos daquele lugar macabro.

Depois de retirarem a Leticia, se depararam com mais um problema, a placenta não se descolava. Em meio a tanta perda de sangue comecei a ter uma crise cianótica, mas me mantive lúcida e acordada, escutando o chorinho da minha filha. A Drª Graça tentava arrancar a placenta com toda sua força e com as unhas encravadas em minha barriga. A cada minuto perguntava se me fazia mal e eu sempre dizia que sentia as suas unhas. Aguentei ainda uns 30 minutos, que me pareceram longos, para a retirada da placenta. A Drª Graça jogou a placenta em cima de uma mesa ao meu lado. Fiquei com uma sensação estranhíssima, como a de estar fazendo parte de um abate de vacas, já que a própria Drª Graça pediu que minha Leticia berrasse.

Terminando sua função, a Drª Graça pediu a sua auxiliar que me fizesse os pontos. Para a minha sorte, vi um rosto conhecido. Tratava-se da Drª Rita. Era uma jovem médica que dias antes tinha me atendido na primeira consulta na MAC. Ela também me reconheceu e, diferente da Drª Graça, ela fez seu trabalho em silêncio e, quando terminou me disse: “Rosana, ficou muito bom. Você vai ficar bem logo. Muitas felicidades!”

Em meio aos tantos demónios existem sempre alguns anjos. Ainda bem!

Minhas visitas mensais na gravidez foram acompanhadas pela Drª Ilda Dias, a Enfermeira Cidália e toda a equipa de trabalho do posto de saúde de São João, extensão Júlia Moreira.

Foi uma escolha minha e do meu marido, optar pelo sistema público, depois de conhecer o profissionalismo daquela inteira equipa. Elas tinham nos cativado de uma certa maneira, que cheguei a dar uma entrevista para um telejornal sobre a qualidade dos serviços públicos de saúde em Portugal. Eis o porque da minha surpresa na MAC, considerada essa, a melhor maternidade do país.

Eu, em meio a discussão, desequilíbrio e falta de postura da Drª Graça, que de graça tem pouco, cheguei a repetir isso: “Estou aqui não somente por ser um sistema público, mas porque a MAC é conhecida como a melhor maternidade do país.” Pois é. Se é assim. Como será a pior? E, para já, deixo-vos mais uma pergunta: Qual o sentido da maternidade para as maternidades???

O artigo da jornalista Rosana Antonio foi publicado parcialmente, na Revista “O Brasileirinho”, Revista Pais e Filhos (Portugal). Em Alguns jornais e revistas brasileirias em diferentes estados. E integralmente, no Quaderno Maternus (Itália). Após a sua denúncia, outras cinco mulheres manifestaram terem sido mal tratadas em hospitais e maternidades portuguesas. Denuncie você também!

Fonte do texto: http://quadernomaternus.blogspot.com/
Foto: http://olhares.aeiou.pt/reportagem_maternidade__18_foto158111.html?nav1

quarta-feira, 26 de outubro de 2011

O útero vazio

Pablo Picasso

No final de 2009 eu cheguei ao auge de um mal-estar causado pela decisão de não ter filhos. Uma inadequação aguda, uma sensação de ser incompleta, estranha e disfuncional tomou conta de mim e eu não tive com quem conversar pelo simples fato de que eu não conhecia nenhuma outra mulher casada que havia decidido desde muito jovem não ter filhos e que não mais sabia onde e como existir diante da completa falta de afinidade com as mulheres-mães ao redor. Talvez por isso eu tenha desejado com todas as minhas forças encontrar pelo menos um livro, um testemunho, um diário, uma carta, um bilhete, qualquer coisa escrita por alguém que se sentisse como eu.

O desconforto daquela fase foi tamanho que pela primeira vez na vida passei a questionar a minha velha conhecida decisão de não ter filhos: “Será que eu não quero mesmo me tornar mãe? Seria tão mais fácil se eu quisesse! Mas se é assim tão mais fácil por que eu simplesmente não consigo sentir que quero ser mãe?”. Cheguei à conclusão de que eu precisava compreender melhor o que havia me levado a considerar e desejar uma vida sem filhos por todos aqueles (pelo menos 15) anos: a origem, a razão, as conseqüências dessa decisão, e tudo o mais que eu pudesse descobrir e entender sobre uma vida sem filhos, para só então decidir definitivamente o que fazer.

Lembro que após algumas horas de pesquisa na internet ficou muito claro para mim que não era fácil encontrar um livro em português sobre o assunto. Encontrei alguns em inglês e em francês, mas traduzir é o que eu faço para viver e naquele momento eu queria algo que eu pudesse ler sem esforço, sem desgaste, apenas algumas páginas de conforto, de alívio, escritas por uma mulher que não tivesse filhos, dividindo a experiência dela comigo. Fosse boa ou ruim, não importava, eu só queria saber como era, como ela se sentia, como ela sobrevivia, e se era possível ser feliz sem ser mãe.

Tentei as mais diversas combinações de palavras-chaves no Google e cheguei a encontrar algumas entrevistas com casais sem filhos e artigos sobre o preconceito, o estigma... mas estes eram tesouros escassos enterrados em blogs e revistas de variedades, que logo chegavam ao fim sem indicar uma trilha para o próximo texto a ser lido.
Eu estava constantemente lidando com a frustração de ter que retomar a pesquisa e torcer para encontrar algo novo para ler porque não havia uma fonte de informação (museu, biblioteca, site, revista ou blog) dedicada aos aspectos e desafios de uma vida sem filhos que pudesse ser lida no meu idioma e à qual eu pudesse voltar com a certeza de que haveria algo novo na minha próxima visita.

Foi então que decidi juntar e compartilhar o pouco que eu havia encontrado em um armazém online que chamei de Útero Vazio. Um útero vazio que acaba de completar 22 meses de vida e que agora está repleto de sugestões de livros, filmes, biografias, podcasts, artigos acadêmicos, matérias de jornais e revistas, estudos e pesquisas sobre a questão da maternidade consciente e da possibilidade de escolha de uma vida sem filhos.

Um blog cujo objetivo não é decidir, nem sugerir a nenhuma mulher o rumo que ela deve tomar em relação à maternidade, mas sim oferecer a cada uma delas um espaço livre de condicionamentos biológicos, imposições históricas, preconceitos sociais, ou pressões maritais; uma brecha, um refúgio, uma sala de estar onde elas poderão se encontrar, se informar, questionar e refletir acerca da possibilidade de incluírem ou excluírem a maternidade de suas vidas sem sentimentos de obrigação, inadequação ou culpa.

Um espaço que permite a reflexão que, por sua vez, possibilita que a decisão sobre a maternidade não seja apenas tomada, mas muito bem pensada, e mais do que isso: de fato, desejada. Já que tão importante quanto decidir ser ou não ser mãe, é ser capaz de descobrir quando e por que fazê-lo. E tão importante quanto a coragem para reconhecer o desinteresse pela experiência de gerar e tornar-se responsável por uma vida é a coragem para assumir o desejo racional e o compromisso de gestar, parir e cuidar de um filho.

E mais importante do que tudo isso é garantir que a decisão final, qualquer que seja, venha precedida de uma íntima auto-avaliação, de uma visita às profundezas de nós mesmas para que sejamos capazes de identificar, conhecer, explorar e respeitar as nossas características, aptidões, inclinações, limitações, dificuldades e desejos. Porque só então estaremos prontas para decidir e viver em paz com a nossa decisão final sobre a maternidade. Decisão esta que, agora eu sei, é pessoal, individual e intransferível.

Nicole Rodrigues

quarta-feira, 19 de outubro de 2011

Coco Chanel




Depois de longas semanas sem internet eu volto trazendo o brilho de Coco Chanel que não hesitou em me surpreender, mais uma vez. Já faz algum tempo que ando de olho nela. Leio aqui e ali sobre a vida da menina orfã francesa que moldou sua imagem e definiu seu futuro do pó, ou melhor, do pano, se transformando na maior revolucionária das roupas femininas de todos os tempos. Uma costureira e, depois, estilista de mão cheia!

Eu já sabia que ela não se casou e que não teve filhos, mas não sabia que teve um romance com um dos mais famosos compositores da música clássica do século XX. Mas ela não para por aí, não senhoras! Se esse segundo filme (Coco Chanel & Igor Stravinsky), que eu indico para a sessão pipoca dessa semana, estiver certo: ela não só deitou e rolou com ele em lençóis de seda preta e branca como foi responsável por garantir financeiramente que a carreira dele se firmasse. Quem diria que, talvez, se não fosse a Coco o Stravinsky poderia ter sido só mais um Igor na Rússia.

segunda-feira, 26 de setembro de 2011

A paz de Wangari Maathai



Querida Wangari Maathai,

Foi com tristeza que li o jornal esta manhã e descobri que você não mais está entre nós. E o gosto dessa perda é ainda mais amargo porque há meses, se não anos,  tenho anotado no meu caderno de mulheres admiráveis pequenas notas na esperança de não esquecê-la e de encontrar tempo para pesquisar mais, traduzir e escrever sobre a sua fantástica história de superação e conquista. Perdoe-me por não ter conseguido fazê-lo antes. Mas o faço agora, como que num transe, ainda de pijamas e sem café da manhã, porque não há mais tempo a perder.

Vá em paz, Maathai. A paz que você ajudou a plantar aqui na terra.


ERA UMA VEZ

Em 1966, Wangari se casou com Mwangi Mathai, um jovem que, assim como ela, havia procurado melhores oportunidades de estudos nos Estados Unidos. Treze anos e três filhos depois o marido dela entrou com o pedido de divórcio e para justificar o divórcio declarou que ela “tinha uma mente muito forte para uma mulher e que ele não conseguia controlá-la”. O juiz do caso concordou com o marido. Logo após a audiência, Wangari foi entrevistada pela revista Viva magazine e se referiu ao juiz como incompetente e corrupto. A entrevista despertou a ira do juiz e ela foi acusada de desacato à corte, condenada e sentenciada a seis meses de prisão. Após o terceiro dia na prisão o advogado dela formulou uma declaração oficial que a corte julgou ser o suficiente para liberá-la. Anos mais tarde o ex-marido a proibiu de usar o seu sobrenome de casada “Mathai” então ela adicionou mais um “a” ao sobrenome e passou a usar o “Maathai”.

MINI-BIOGRAFIA
Esta seria apenas mais uma história de mais uma mulher continuamente punida por “ser muito forte para uma mulher” e que provavelmente seria esquecida, se é que sequer seria conhecida, não fosse o fato de que a protagonista em questão é Wangari Muta Maathai (1 abril de 1940 – 25 de setembro de 2011). Bióloga, ativista ambiental e política que em 1971 se tornou a primeira mulher africana a obter um Ph.D., ao concluir um Doutorado em Anatomia pela Universidade de Nairóbi. Ainda na década de 1970 Maathai fundou o Green Belt Movement (Movimento Cinturão Verde), uma organização ambiental não-governamental focada na plantação de árvores, conservação ambiental e direitos das mulheres. Em 2002 Maathai foi eleita para o Parlamento e nomeada ministra assistente do Meio Ambiente no governo do Presidente Mwai Kibaki entre janeiro de 2003 e novembro de 2005. Em 2004 ela se tornou a primeira mulher africana a receber o prêmio Nobel da Paz pela sua “contribuição ao desenvolvimento sustentável, democracia e paz.”*

Mesmo após ter sido abandonada pelo marido, ter tido que abandonar os filhos por vários anos por não poder mantê-los sozinha, e ter sido presa e ameaçada de morte por lutar pela democracia no Quênia, Wangari Maathai não deixou de lutar até o fim da vida por todas as coisas nas quais acreditava. E basta ler a biografia dela para saber que ela acreditava em muitas coisas boas, apesar de ter sofrido tantas ruins.

AUTOBIOGRAFIA

"Em 10 de janeiro de 1992, muitos de nós nos reunimos em Nairóbi (...) para traçar uma estratégia que nos permitisse levar adiante o movimento pró-democracia. Durante esse encontro (...) uma informação me deixou enregelada:

- Acabamos de saber, de fonte segura, que Moi (ex-presidente do Quênia) quer entregar o poder ao exército - disse a pessoa que telefonou.

E citou o meu nome, entre outros tantos, como integrante de uma lista de pessoas a serem assassinadas. (...) Decidi me entrincheirar em casa. (...) A polícia não demorou a chegar, (...) deixando quatro homens armados para vigiar a casa durante a noite toda.

No dia seguinte, a notícia de que eu estava cercada se espalhou. (...) Os amigos e a imprensa começaram a se juntar na calçada. (...) De dentro de casa, falei com o máximo de jornalistas que consegui, (...) expliquei por que não queríamos que o poder passasse às mãos do exército.

Falei da fraude nas eleições de 1988 e de como o presidente estava assustado com a perspectiva de novas eleições, pois sabia que seria derrotado. (...) Logo, logo ouvi botas arrombando as portas (...)

Mais uma vez, estava atrás das grades (...). Passei um dia e uma noite tentando dormir no chão (...) em meio a água e sujeira. (...) À diferença da primeira vez que fui presa, não tinha agora cobertor e estava sozinha na cela.

Também tinha 52 anos, artrite nos dois joelhos e sofria de dores nas costas. (...) Chorando de dor e enfraquecida pela fome, tive de ser carregada até o tribunal (...) As pessoas ficaram chocadas ao ver que eu sequer conseguia ficar de pé para a leitura das acusações.

(...) Do tribunal, fui carregada até a ambulância que me levaria ao Hospital Nairóbi (...) Então, vi uma faixa do grupo Mães em Ação, que lutava pelos direitos da mulher. Essa visão acalentou meu coração e me ajudou a perceber que, independentemente do que pudesse me acontecer, haveria gente preocupada, querendo me ver bem, gente que compreendia o que significava ser uma mulher que lutava pelo futuro de seu país. "Wangari, brava filha do Quênia, você nunca mais estará sozinha" - estava escrito na faixa.
 

*declarou o Comitê Norueguês ao anunciar a vencedora do Prêmio Nobel da Paz de 2004.

sábado, 24 de setembro de 2011

Mulheres e criação artística



Quando sobra tempo eu escrevo, e quando sobra ainda mais tempo eu leio. Hoje decidi visitar os blogs que "sigo" mas, infelizmente, não com a frequência que eu gostaria. Passeei e curiei até encontrar mais um precioso texto que eu gostaria de compartilhar com vocês. Desta vez o achado foi no blog Sexismo e Misoginia da inteligentíssima Adília (não sei e não encontrei o seu sobrenome caríssima, desculpe).

Vou postar apenas um trecho do texto "Mulheres e criação artística" na esperança de que vocês visitem o blog da Adília para a leitura completa que, certamente, vale a pena.


"as mulheres foram marginalizadas do domínio da criação artística como o foram de outras esferas de poder e tal marginalização não teve a ver com motivos de natureza biológica mas tão somente com a preocupação de as afastar de qualquer esfera da ação humana que lhes garantisse independência e desenvolvimento. Os exemplos são tantos e tão variados que dificilmente se pode negar esta afirmação; mesmo recentemente conhecemos casos de mulheres praticamente impedidas de desenvolverem os seus talentos por razões de imposição social e cultural e remetidas para a esfera doméstica de serviço à família, maridos e filhos incluídos."

Imagem: quadro "A lady writing a letter with her maid" do pintor Johannes Vermeer.

terça-feira, 20 de setembro de 2011

Brasil 'descumprirá meta do milênio para mortalidade materna', diz estudo



O Brasil deixará de cumprir uma das chamadas metas do milênio para a saúde pública porque o ritmo de redução na mortalidade materna foi medíocre na última década, indica um estudo publicado nesta terça-feira na Grã-Bretanha.

Embora o país tenha avançado na redução da mortalidade de mulheres por conta de complicações com o parto ou a gestação, o lento ritmo de melhora significa que o país chegaria com 25 anos de atraso às metas que deveria cumprir já em 2015.
A pesquisa foi coordenada pelos professores Rafael Lozano e Christopher Murray, do Instituto de Métrica e Avaliação da Saúde (IHME, na sigla em inglês) da Universidade de Washington, Seattle, nos Estados Unidos, e publicada na revista científica britânica The Lancet.
Os pesquisadores calcularam estimativas para o ano de 2011 levando em conta fontes de dados relevantes que haviam ficado de fora de análises anteriores, como registros de nascimento e óbito, pesquisas nacionais, censos e levantamentos feitos pelas autoridades de saúde.

Segundo as estimativas mais recentes, mais de 65 mulheres em cada 100 mil parturientes morrem no Brasil em decorrência de problemas na gestação ou no parto. Nos últimos onze anos, quando o mundo viu uma redução anual de 3,6% nesta estatística, no Brasil o ritmo foi de apenas 0,3%.

Um dos autores do estudo, Haidong Wang, professor-assistente de Saúde Global do IHME, disse à BBC Brasil que o combate à mortalidade materna teve bons resultados no Brasil entre 1990 e 2000. No período, a taxa caiu de 85,9 para 67 em cada 100 mil, uma redução anual de cerca de 2,5%.

Entretanto, disse Wang, esse avanço foi contido na década seguinte pela epidemia de gripe H1N1 e pela alta percentagem de mulheres que fazem partos cesarianos, nos quais há maior risco de complicações que podem levar à morte.

País é apontado como 'história de sucesso no combate à mortalidade infantil'

"Quando a epidemia de gripe se espalhou, em 2009, matou muitas mulheres que, se não estivessem grávidas, teriam uma grande chance de ter sobrevivido", afirmou. "A epidemia de H1N1 foi um alerta pela necessidade de dar mais atenção tanto a doenças infecciosas, que podem afetar as mulheres durante a gravidez, como a outros fatores crônicos como obesidade."

Metas do milênio

O estudo avaliou o avanço dos países emergentes no cumprimento de duas das metas do milênio, que os países se comprometeram a cumprir até 2015.

Globalmente, a pesquisa estima que o número de mortes relacionadas ao parto caiu de 409 mil para 273 mil entre 1990 e 2011. As mortes de crianças com menos de cinco anos de idade diminuíram de 11,6 milhões para 7,2 milhões no mesmo período.

Apesar do avanço, apenas nove de 137 países emergentes fizeram progressos suficientes para alcançar os objetivos nestas duas áreas: China, Egito, Irã, Líbia, Maldivas, Mongólia, Peru, Síria e Tunísia.

Como o Brasil, 124 chegarão a 2015 sem ter reduzido em 75% a mortalidade materna entre 1990 e 2015, estimam os pesquisadores.

Já o objetivo de diminuir em dois terços a mortalidade entre crianças menores de cinco anos entre 1990 e 2015 seria alcançada por 31 nações emergentes.

No aspecto da mortalidade infantil, o Brasil é apontado como uma "história de sucesso".

A pesquisa estimou em 1990 o Brasil tinha uma mortalidade infantil entre crianças menores de 5 anos de 53 para cada mil nascidas vivas. Dez anos depois a taxa havia caído para 31,5 e chegou neste ano a 20,9.

Em números absolutos, isso significa que a mortalidade tirou a vida de 193 mil crianças em 1990 e deve tirar a de 63 mil neste ano.

"Achamos que parte disso tem a ver com o esforço do governo de prover acesso universal à saúde. Foi depois da implementação deste princípio na Constituição de 1988 e na reforma de 1996 que registramos a taxa mais rápida de declínio nas mortes de crianças com menos de cinco anos", afirmou Wang.
Fonte:
BBC BRASIl
http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2011/09/110920_mortalidade_brasil_pu.shtml
IMAGEM
http://contramachismo.wordpress.com/2010/05/29/mortalidade-materna-na-pauta-do-governo-federal/

domingo, 18 de setembro de 2011

Reflexões sobre a não-legalização do aborto e suas consequências



Sim, sim, queridas uterinas, eu sumi. Mas depois de duas longas e atarefadas semanas cá estou trazendo um texto da sempre contundente Lola Aronovitch, autora do blog Escreva Lola Escreva.

Ainda de olho no tema "Maternidade à força" e saindo do terrível capítulo sobre o estupro, é hora de nos depararmos com o fato (e as consequências) de que vivemos em um país onde o aborto é ilegal.

Deixo como sugestão de leitura o texto "MULHER, ESSE SER IRRESPONSÁVEL QUE SÓ QUER ABORTAR". Segue abaixo o trecho inicial. Para ler essa reflexão na íntegra clique aqui
"Espero que os homens que chamem mulheres que abortam de vagabundas e irresponsáveis saibam que 1) essas mulheres não fizeram o filho sozinhas, e 2) se fosse o homem quem ficasse grávido, o aborto seria legalizado. Sério. Não há a menor dúvida disso, porque ninguém ousaria dizer a um homem que seu corpo não é dele. A questão inteirinha do aborto é uma questão sobre o controle do corpo da mulher. Convém pintar a mulher como um ser alterado, nada confiável, fraco das ideias, que precisa ser controlado. Os reaças que são contra a legalização do aborto acreditam que, sendo contra, não existem abortos. Eles somem, pluft, num passe de mágica! Acontece que eles seguem acontecendo, sempre em número maior que em países onde o aborto é legalizado. E abortos ilegais acabam matando a mulher."

Fonte:
texto: http://escrevalolaescreva.blogspot.com/2011/01/mulher-esse-ser-irresponsavel-que-so.html
imagem: http://en.wikipedia.org/wiki/File:Lange-MigrantMother02.jpg

sábado, 3 de setembro de 2011

Quando a taxa de natalidade é mais importante do que a maternidade (e paternidade) consciente



Prefeito sérvio oferece férias românticas a solteiros para estimular nascimentos


Sérvia vem enfrentando declínio de sua população nos últimos 20 anos


O prefeito de uma pequena cidade da Sérvia está propondo uma saída nova e pouco comum para combater o problema da baixa taxa de natalidade no local: ele criou um esquema para enviar 150 homens e 150 mulheres com idades acima de 38 anos para férias pagas na costa da Grécia, na esperança de que a viagem romântica renda o nascimento de mais alguns bebês na cidade.


A Sérvia vem enfrentando o declínio de sua população nos últimos 20 anos, por conta da pobreza, das guerras dos anos 1990 e uma das taxas de natalidade mais baixas da Europa.
Notícias relacionadasEstado da Índia oferece prêmios a casais que aceitarem esterilizaçãoGoverno de Taiwan promoverá encontros entre servidores solteirosCoreia do Sul libera funcionários mais cedo para incentivar procriaçãoTópicos relacionadosGeral, CuriosidadesNas áreas rurais, como no município de Jagodina, o problema é mais grave, com moradores deixando o local cada vez mais em busca de uma vida melhor nas grandes cidades, gerando o temor de que as pequenas comunidades irão simplesmente desaparecer.

O plano do prefeito Dragan Markovic foi lançado com um jantar de apresentação em um restaurante local. Conforme os candidatos foram chegando, eram sentados em mesas numeradas e os cavalheiros recebiam rosas vermelhas para presentear as damas.
Para quebrar o gelo, Markovic fez um discurso de boas vindas. "Estamos enfrentando uma população em declínio", disse. "A cada ano, uma cidade com 25 mil pessoas desaparece na Sérvia", observou.
Ele listou uma série de incentivos que introduziu para combater o problema, incluindo passes grátis de ônibus e material de papelaria, licença-maternidade generosa e pagamentos em dinheiro para novos pais.

"Queremos 30% a mais de nascimentos na cidade do que no ano passado, então estou chamando o evento de hoje de jantar do amor", diz, antes de pedir aos homens que beijem as mulheres. Alguns obedecem.

Bailinho de escola


O prefeito de Jagodina, Dragan Markovic, diz querer um aumento de 30% nos nascimentos


Conforme a noite avançava, um cantor local chegava, abrindo espaço no centro do restaurante para dança, antes de entreter os convidados com canções folclóricas tradicionais.

O evento começava a parecer um bailinho de escola, com os mais autoconfiantes se exibindo na pista, enquanto outros observavam nervosamente enquanto comiam suas saladas de tomate ou suas tortas de maçã.

Mas a resposta à iniciativa da prefeitura pareceu positiva. "Primeiro eu pensei que esse clima romântico criado pelo prefeito era um pouco forçado e artificial", afirmou Ana Zdravkovic. "Mas agora estou achando legal", contou ela.

"A noite está sendo fantástica. Todo mundo está feliz", acrescentou o dentista Predrag Jevdjic. Questionado se já está de olho em alguém, ele respondeu: "Sim, claro, mas ainda estou mantendo o segredo".

O sapateiro Slavoljub Tanaskovic se disse animado com as perspectivas. "Uma mulher veio à minha mesa e me disse que eu tinha olhos bonitos", disse ele com um sorriso. "Todos os homens ao meu lado ficaram com inveja. Sei que vou ter algo com ela na Grécia - eu posso sentir", garantiu.


'Truque barato'


Viagem dos solteiros à Grécia será paga pela prefeitura e por patrocinadores privados


A iniciativa do prefeito de Jagodina pode se mostrar efetiva, mas para a ativista de direitos humanos e comentarista Sonja Biserko, não atinge o cerne da questão sobre o problema da população sérvia.


"Esse é um truque barato para chamar a atenção da mídia", afirma. "Atrair jovens com a promessa de férias grátis não é garantia para criar uma família estável. Essa não é a receita que a sociedade deveria oferecer como mecanismo para aproximar os jovens", argumenta.

"É uma forma limitada de combater o problema de uma sociedade em envelhecimento e um país pobre o qual os jovens querem deixar. É só uma substituição para a falta de perspectivas na Sérvia", afirma.


A viagem dos solteiros de Jagodina à Grécia, neste mês, será paga com recursos da prefeitura e também com o apoio de patrocinadores privados, segundo o prefeito. Seus 300 escolhidos estão dispostos a testar sua ideia de cupido ao estilo sérvio, aproveitando também a perspectiva de curtir um pouco de sol e mar.

Em nove meses, será possível se ter uma ideia se a iniciativa é somente uma tentativa de engenharia social vinda da cabeça de um prefeito com dinheiro em caixa e em busca da reeleição ou uma ideia altruísta para ajudar os cidadãos de Jagodina a encontrarem o amor.




sexta-feira, 26 de agosto de 2011

A maternidade à força


Já faz algum tempo que venho tentando escrever sobre a maternidade à força, resultado de um estupro. Primeiro imposta pelo estuprador e depois por quem não instrui ou permite que a criança, adolescente ou mulher adulta interrompa aquela gravidez que está longe de ser apenas "indesejada".

Muitas vezes as vítimas são tão jovens que não sabem que estão grávidas até a barriga ficar enorme, as pessoas mais próximas começarem a fazer perguntas e, com sorte, alguém explicar o quê e porquê. Conscientes ou não do que a mudança sofrida por seus corpos representa o fato é que elas  só se dão conta da mudança imposta em suas vidas depois de verem o bebê berrar ao sair de dentro delas.

Muitas chegarm ao estágio final da gravidez porque não sabem o que é um aborto, enquanto outras não recebem permissão dos pais, do governo, nem de deus – é o que ouvem – para fazê-lo e são obrigadas a se tornarem mães sem terem tido a chance de escolher absolutamente nada: nem quando, nem como, e muito menos, com quem elas gostariam de ter um filho. Se é que elas gostariam de ter um filho, o que, a essa altura, parece não fazer a menor diferença, assim como obviamente se quer passou pela cabeça dos monstros que cruzaram e mudaram seus caminhos para sempre.

Na minha primeira tentativa eu havia chegado até aqui. Mas tudo o que escrevi me pareceu simples e indolor demais para servir de material para uma reflexão realista e contundente sobre esse assunto. Talvez tenha sido assim porque eu, muito provavelmente por nada mais do que sorte, não fui vítima dessa atrocidade, e me faltam palavras para descrever as terríveis sensações e sentimentos que teriam sido despertados em mim caso a minha história fosse diferente.

Eu já havia deixado esse assunto de lado quando algo extraordinário aconteceu: eu resolvi criar um outro post e abri, muito aleatoriamente, um dos livros que separei para ler esse semestre, “A cor púrpura” de Alice Walker, então sentei e li o primeiro capítulo. E ao final, bastante emocionada, eu percebi que tudo o que poderia ser escrito sobre o horror que acompanha a experiência da maternidade à força já havia sido escrito.

OBS1: o trecho abaixo está em português europeu mas eu tenho certeza de que todas as diferenças poderão ser assimiladas e não comprometerão a leitura e compreensão do texto.


 A COR PÚRPURA

" Não contes a ninguém se não à Deus. Era capaz de matar a tua mãe.

Meu Deus: Tenho catorze anos. Tenho sido sempre boa rapariga. Talvez possas fazer-me algum sinal que me faça perceber o que me está a acontecer. Na primavera passada, pouco depois de Lucious nascer, ouví-os brigar. Ele puxava-lhe por um braço e ela diz: É muito cedo, Afonso, inda não estou bem. Ele deixava-a em paz, mas na semana seguinte, volta a puxar-lhe pelo braço. E ela dizia: Não, não posso. Não vês que estou quase morta? E essas crianças todas.

Ela tinha ido a Macon para ser vista pela irmã doutora e fiquei a tomar conta dos miúdos. Ele não me disse nem uma palavra amável. Só: O que a tua mãe não quer fazer, vais tu fazer. E encostou-me aquela coisa à anca e começou a mexe-la e agarrou-me a mama e metia-me a coisa por baixo e, quando eu gritei, esganou-me e disse: O melhor é calares o bico e começares a te acostumar. Mas nunca me acostumei. E agora fico indisposta cada vez que tenho que fazer comida. A mãe anda ralada e passa a vida a olhar para mim, mas já está mais feliz porque ele a deixa em paz. Mas está muito doente e parece que não dura muito.

Meu Deus: A mãe morreu. Morreu a gritar e a praguejar. Gritava comigo. Praguejava para mim. Estou prenha. Não posso mexer-me bem. Ainda não chego do paço e a água já esta quente. Ainda não preparo a bandeja e a comida já ficou fria. Ainda não arranjo os miúdos para irem para a escola e já são horas de almoçar. Ele não dizia nada. Estava sentado à beira da cama. Pegava na mão dela e chorava e repetia: Não me deixes, não te vás embora. Quando foi do primeiro, ela perguntou: De quem é? Eu disse: De Deus. Não conheço mais nenhum homem e não sei que dizer. Quando comecei a ter dores de barriga e ela a mexer-se e saiu de lá aquele bebe que mordia a mão fiquei pasmada. Ninguém nos vinha ver. Ela estava pior e cada vez pior. Um dia perguntou-me: Onde está? Eu disse: Deus levou-o. Mas foi ele que o levou. Levou-o quando eu estava a dormir. E matou-o no bosque. E vai matar este agora se puder.

Meu Deus: Diz que está farto. Já não pode comigo. Diz que sou má e só aborreço. Tirou-me o outro bebê. Era um menino. Mas parece-me a mim que não o matou. Acho que o vendeu a um casal de Monticello. Tenho o peito cheio de leite e sai sempre e estou encharcada. Ele pergunta: Porque não tens um ar mais decente? Veste qualquer coisa. Que quer ele que eu vista? Não tenho nada. Oxalá encontre alguém para se casar. Olha muito para a minha irmã mais nova e ela tem medo. Mas eu digo: Eu tomo conta de ti. Se Deus me ajudar. "

sexta-feira, 19 de agosto de 2011

A imposição da maternidade via vínculos e vernáculos religiosos


A caminhada é longa, e nem sempre fácil. Já que entre um e outro texto esclarecedor sobre as questões da maternidade consciente e do processo de escolha de uma vida com ou sem filhos, eu trombo com um texto abominável como este, escrito pelo Albert Mohler e traduzido para o português do Brasil por Julio Severo.

Segundo ele,  a escolha deliberada de um lar sem filhos não é um direito, mas sim uma “rebelião moral com uma nova face”. E ele continua o disparate:

Os cristãos precisam reconhecer que essa rebelião contra a paternidade representa nada menos do que uma revolta absoluta contra o plano de Deus. A Bíblia mostra que um casamento sem filhos é grande maldição e que filhos são um presente divino. O salmista declarou: “Os filhos são herança do SENHOR, uma recompensa que ele dá. Como flechas nas mãos do guerreiro são os filhos nascidos na juventude. Como é feliz o homem que tem a sua aljava cheia deles! Não será humilhado quando enfrentar seus inimigos no tribunal”. (Salmo 127: 3-5 NVI)

Moralmente falando, a epidemia de lares sem filhos não tem nada a ver com os casais legalmente casados que desejam ter filhos, mas por algum motivo não têm a capacidade física de tê-los. A questão envolve os casais que têm plena capacidade de ter filhos, mas os rejeitam como intrusão em seu estilo de vida.

(...)

As Escrituras Sagradas nem mesmo imaginam casais que escolhem não ter filhos. A realidade chocante é que alguns cristãos estão engolindo esse estilo de vida e afirmam que um casamento sem filhos é uma opção legítima. O surgimento dos modernos anticoncepcionais tornou tecnologicamente possível tal opção. Mas o fato permanece que embora a revolução dos anticoncepcionais tenha possibilitado o casamento sem filhos, esse tipo de casamento é uma forma de rebelião contra o plano e ordem de Deus.



Eu não acredito que exista, mas se houver um deus, ele(a) certamente será, em toda a sua infinitamente citada benevolência, capaz de conceder a liberdade de escolha a todos os seus filhos. E se não houver um deus, a nossa responsabilidade será ainda maior. Porque o nosso destino passará a ser nosso, e apenas nosso. E caberá a cada um de nós combater a imposição da maternidade via vínculos e vernáculos religiosos para garantir que o nosso direito à escolha de um estilo de vida que nos faça feliz seja respeitado, principalmente quando se trata de algo que não afeta, nem prejudica, a vida de mais ninguém, como é o caso da escolha de uma mulher ou de um casal de não ter filhos.

Com ou sem deus, com ou sem filhos, permita-se ser feliz e permita que o outro seja feliz com as decisões que tomou, ainda que estas não sejam semelhantes às suas. Afinal de contas, o mundo não gira em torno da sua imagem e semelhança.

Nicole Rodrigues


Fontes: :
- Versão em português do texto do Albert Mohler:
http://juliosevero.blogspot.com/2006/03/escolha-deliberada-de-lares-sem-filhos.html
- Original em inglês: The Al Mohler Crosswalk Commentary — Deliberate Childlessness:Moral Rebellion With a New Face, June 7, 2005.
- imagem: http://www.stmarybelleville.org/Find.html






sábado, 13 de agosto de 2011

Meio sol amarelo


"You must never behave as if your life belongs to a man. Do you hear me?' Aunty Ifeka said. 'Your life belongs to you and you alone."  Chimamanda Ngozi Adichie (author of the book Half of a Yellow Sun)

"Você nunca deve agir como se a sua vida pertencesse a um homem. Você está me ouvindo?" A tia Ifeka disse: a sua vida pertence a você e a mais ninguém." Chimamanda Ngozi Adichie (autora do livro Meio sol amarelo)


Tradução: Nicole Rodrigues

sexta-feira, 12 de agosto de 2011

Uma em três mulheres dá à luz sem ajuda especializada


Um terço das mulheres do mundo dá à luz sem a ajuda de especialistas, aponta um relatório feito pela ONG britânica Save the Children e divulgado em abril deste ano.


O relatório estima que, se houvesse mais 350 mil parteiras no mundo, elas poderiam salvar a vida de 1 milhão de bebês anualmente.
Enquanto na Grã-Bretanha apenas 1% das crianças nasce sem que o parto seja assistido por especialistas, essa porcentagem sobe para 94 na Etiópia e para 76 em Bangladesh.


“Não deveria ser algo complicado: alguém que saiba como secar o bebê corretamente e a ajudá-lo a respirar pode fazer a diferença entre sua vida e morte”, diz Justin Forsyth, executivo-chefe da Save the Children.


A ONG cobra ações da ONU e de governos doadores a países subdesenvolvidos, pedindo que apoiem e financiem o treinamento de mais parteiras.

Segundo o relatório, a asfixia ao nascer é responsável por mais mortes de bebês do que a malária. “Com treinamento e equipamentos corretos, parteiras podem monitorar a frequência cardíaca do feto e identificar problemas durante o parto”, diz o texto.
No total, a Save the Children calcula em 48 milhões o número de mulheres que, anualmente, dão à luz sem auxílio adequado, aumentando os riscos de morte tanto da mãe quanto do recém-nascido.


O Brasil não é citado pelo relatório.
O Afeganistão é apontado como o pior país do mundo para se ter um bebê, segundo a ONG britânica. Ali, a taxa de mortalidade infantil é de 52 a cada mil nascimentos vivos (no Brasil, essa taxa é de 19,88), e 20% das crianças morrem antes de completar cinco anos.


Muitas dessas mortes são ocasionadas por práticas tribais, como colocar recém-nascidos no chão – o que traz risco de infecções – para espantar maus espíritos.


Mas, ao mesmo tempo, o correspondente da BBC em Cabul Paul Wood relata algumas pequenas melhorias no país, como o treinamento de 2,4 mil parteiras desde 2002 e o aumento no número de partos assistidos nas zonas rurais.
Um exemplo tanto dos flagelos quanto dos avanços do país é Rogul, 35, uma afegã da província de Cabul que disse à BBC que já passou por oito partos prematuros e perdeu todos os bebês.

Sua nona gravidez foi até o fim, mas a criança morreu um dia depois de nascer. Desde então, ela fez um curso para se tornar uma parteira e, agora, além de ter conseguido ter filhos, ensina práticas de saúde e higiene para outras afegãs.

Fontes:
Texto - BBC Brasil
http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2011/04/110401_parteiras_pai.shtml
Imagem: http://www.historyforkids.org/learn/people/midwife.htm

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