segunda-feira, 26 de setembro de 2011

A paz de Wangari Maathai



Querida Wangari Maathai,

Foi com tristeza que li o jornal esta manhã e descobri que você não mais está entre nós. E o gosto dessa perda é ainda mais amargo porque há meses, se não anos,  tenho anotado no meu caderno de mulheres admiráveis pequenas notas na esperança de não esquecê-la e de encontrar tempo para pesquisar mais, traduzir e escrever sobre a sua fantástica história de superação e conquista. Perdoe-me por não ter conseguido fazê-lo antes. Mas o faço agora, como que num transe, ainda de pijamas e sem café da manhã, porque não há mais tempo a perder.

Vá em paz, Maathai. A paz que você ajudou a plantar aqui na terra.


ERA UMA VEZ

Em 1966, Wangari se casou com Mwangi Mathai, um jovem que, assim como ela, havia procurado melhores oportunidades de estudos nos Estados Unidos. Treze anos e três filhos depois o marido dela entrou com o pedido de divórcio e para justificar o divórcio declarou que ela “tinha uma mente muito forte para uma mulher e que ele não conseguia controlá-la”. O juiz do caso concordou com o marido. Logo após a audiência, Wangari foi entrevistada pela revista Viva magazine e se referiu ao juiz como incompetente e corrupto. A entrevista despertou a ira do juiz e ela foi acusada de desacato à corte, condenada e sentenciada a seis meses de prisão. Após o terceiro dia na prisão o advogado dela formulou uma declaração oficial que a corte julgou ser o suficiente para liberá-la. Anos mais tarde o ex-marido a proibiu de usar o seu sobrenome de casada “Mathai” então ela adicionou mais um “a” ao sobrenome e passou a usar o “Maathai”.

MINI-BIOGRAFIA
Esta seria apenas mais uma história de mais uma mulher continuamente punida por “ser muito forte para uma mulher” e que provavelmente seria esquecida, se é que sequer seria conhecida, não fosse o fato de que a protagonista em questão é Wangari Muta Maathai (1 abril de 1940 – 25 de setembro de 2011). Bióloga, ativista ambiental e política que em 1971 se tornou a primeira mulher africana a obter um Ph.D., ao concluir um Doutorado em Anatomia pela Universidade de Nairóbi. Ainda na década de 1970 Maathai fundou o Green Belt Movement (Movimento Cinturão Verde), uma organização ambiental não-governamental focada na plantação de árvores, conservação ambiental e direitos das mulheres. Em 2002 Maathai foi eleita para o Parlamento e nomeada ministra assistente do Meio Ambiente no governo do Presidente Mwai Kibaki entre janeiro de 2003 e novembro de 2005. Em 2004 ela se tornou a primeira mulher africana a receber o prêmio Nobel da Paz pela sua “contribuição ao desenvolvimento sustentável, democracia e paz.”*

Mesmo após ter sido abandonada pelo marido, ter tido que abandonar os filhos por vários anos por não poder mantê-los sozinha, e ter sido presa e ameaçada de morte por lutar pela democracia no Quênia, Wangari Maathai não deixou de lutar até o fim da vida por todas as coisas nas quais acreditava. E basta ler a biografia dela para saber que ela acreditava em muitas coisas boas, apesar de ter sofrido tantas ruins.

AUTOBIOGRAFIA

"Em 10 de janeiro de 1992, muitos de nós nos reunimos em Nairóbi (...) para traçar uma estratégia que nos permitisse levar adiante o movimento pró-democracia. Durante esse encontro (...) uma informação me deixou enregelada:

- Acabamos de saber, de fonte segura, que Moi (ex-presidente do Quênia) quer entregar o poder ao exército - disse a pessoa que telefonou.

E citou o meu nome, entre outros tantos, como integrante de uma lista de pessoas a serem assassinadas. (...) Decidi me entrincheirar em casa. (...) A polícia não demorou a chegar, (...) deixando quatro homens armados para vigiar a casa durante a noite toda.

No dia seguinte, a notícia de que eu estava cercada se espalhou. (...) Os amigos e a imprensa começaram a se juntar na calçada. (...) De dentro de casa, falei com o máximo de jornalistas que consegui, (...) expliquei por que não queríamos que o poder passasse às mãos do exército.

Falei da fraude nas eleições de 1988 e de como o presidente estava assustado com a perspectiva de novas eleições, pois sabia que seria derrotado. (...) Logo, logo ouvi botas arrombando as portas (...)

Mais uma vez, estava atrás das grades (...). Passei um dia e uma noite tentando dormir no chão (...) em meio a água e sujeira. (...) À diferença da primeira vez que fui presa, não tinha agora cobertor e estava sozinha na cela.

Também tinha 52 anos, artrite nos dois joelhos e sofria de dores nas costas. (...) Chorando de dor e enfraquecida pela fome, tive de ser carregada até o tribunal (...) As pessoas ficaram chocadas ao ver que eu sequer conseguia ficar de pé para a leitura das acusações.

(...) Do tribunal, fui carregada até a ambulância que me levaria ao Hospital Nairóbi (...) Então, vi uma faixa do grupo Mães em Ação, que lutava pelos direitos da mulher. Essa visão acalentou meu coração e me ajudou a perceber que, independentemente do que pudesse me acontecer, haveria gente preocupada, querendo me ver bem, gente que compreendia o que significava ser uma mulher que lutava pelo futuro de seu país. "Wangari, brava filha do Quênia, você nunca mais estará sozinha" - estava escrito na faixa.
 

*declarou o Comitê Norueguês ao anunciar a vencedora do Prêmio Nobel da Paz de 2004.

sábado, 24 de setembro de 2011

Mulheres e criação artística



Quando sobra tempo eu escrevo, e quando sobra ainda mais tempo eu leio. Hoje decidi visitar os blogs que "sigo" mas, infelizmente, não com a frequência que eu gostaria. Passeei e curiei até encontrar mais um precioso texto que eu gostaria de compartilhar com vocês. Desta vez o achado foi no blog Sexismo e Misoginia da inteligentíssima Adília (não sei e não encontrei o seu sobrenome caríssima, desculpe).

Vou postar apenas um trecho do texto "Mulheres e criação artística" na esperança de que vocês visitem o blog da Adília para a leitura completa que, certamente, vale a pena.


"as mulheres foram marginalizadas do domínio da criação artística como o foram de outras esferas de poder e tal marginalização não teve a ver com motivos de natureza biológica mas tão somente com a preocupação de as afastar de qualquer esfera da ação humana que lhes garantisse independência e desenvolvimento. Os exemplos são tantos e tão variados que dificilmente se pode negar esta afirmação; mesmo recentemente conhecemos casos de mulheres praticamente impedidas de desenvolverem os seus talentos por razões de imposição social e cultural e remetidas para a esfera doméstica de serviço à família, maridos e filhos incluídos."

Imagem: quadro "A lady writing a letter with her maid" do pintor Johannes Vermeer.

terça-feira, 20 de setembro de 2011

Brasil 'descumprirá meta do milênio para mortalidade materna', diz estudo



O Brasil deixará de cumprir uma das chamadas metas do milênio para a saúde pública porque o ritmo de redução na mortalidade materna foi medíocre na última década, indica um estudo publicado nesta terça-feira na Grã-Bretanha.

Embora o país tenha avançado na redução da mortalidade de mulheres por conta de complicações com o parto ou a gestação, o lento ritmo de melhora significa que o país chegaria com 25 anos de atraso às metas que deveria cumprir já em 2015.
A pesquisa foi coordenada pelos professores Rafael Lozano e Christopher Murray, do Instituto de Métrica e Avaliação da Saúde (IHME, na sigla em inglês) da Universidade de Washington, Seattle, nos Estados Unidos, e publicada na revista científica britânica The Lancet.
Os pesquisadores calcularam estimativas para o ano de 2011 levando em conta fontes de dados relevantes que haviam ficado de fora de análises anteriores, como registros de nascimento e óbito, pesquisas nacionais, censos e levantamentos feitos pelas autoridades de saúde.

Segundo as estimativas mais recentes, mais de 65 mulheres em cada 100 mil parturientes morrem no Brasil em decorrência de problemas na gestação ou no parto. Nos últimos onze anos, quando o mundo viu uma redução anual de 3,6% nesta estatística, no Brasil o ritmo foi de apenas 0,3%.

Um dos autores do estudo, Haidong Wang, professor-assistente de Saúde Global do IHME, disse à BBC Brasil que o combate à mortalidade materna teve bons resultados no Brasil entre 1990 e 2000. No período, a taxa caiu de 85,9 para 67 em cada 100 mil, uma redução anual de cerca de 2,5%.

Entretanto, disse Wang, esse avanço foi contido na década seguinte pela epidemia de gripe H1N1 e pela alta percentagem de mulheres que fazem partos cesarianos, nos quais há maior risco de complicações que podem levar à morte.

País é apontado como 'história de sucesso no combate à mortalidade infantil'

"Quando a epidemia de gripe se espalhou, em 2009, matou muitas mulheres que, se não estivessem grávidas, teriam uma grande chance de ter sobrevivido", afirmou. "A epidemia de H1N1 foi um alerta pela necessidade de dar mais atenção tanto a doenças infecciosas, que podem afetar as mulheres durante a gravidez, como a outros fatores crônicos como obesidade."

Metas do milênio

O estudo avaliou o avanço dos países emergentes no cumprimento de duas das metas do milênio, que os países se comprometeram a cumprir até 2015.

Globalmente, a pesquisa estima que o número de mortes relacionadas ao parto caiu de 409 mil para 273 mil entre 1990 e 2011. As mortes de crianças com menos de cinco anos de idade diminuíram de 11,6 milhões para 7,2 milhões no mesmo período.

Apesar do avanço, apenas nove de 137 países emergentes fizeram progressos suficientes para alcançar os objetivos nestas duas áreas: China, Egito, Irã, Líbia, Maldivas, Mongólia, Peru, Síria e Tunísia.

Como o Brasil, 124 chegarão a 2015 sem ter reduzido em 75% a mortalidade materna entre 1990 e 2015, estimam os pesquisadores.

Já o objetivo de diminuir em dois terços a mortalidade entre crianças menores de cinco anos entre 1990 e 2015 seria alcançada por 31 nações emergentes.

No aspecto da mortalidade infantil, o Brasil é apontado como uma "história de sucesso".

A pesquisa estimou em 1990 o Brasil tinha uma mortalidade infantil entre crianças menores de 5 anos de 53 para cada mil nascidas vivas. Dez anos depois a taxa havia caído para 31,5 e chegou neste ano a 20,9.

Em números absolutos, isso significa que a mortalidade tirou a vida de 193 mil crianças em 1990 e deve tirar a de 63 mil neste ano.

"Achamos que parte disso tem a ver com o esforço do governo de prover acesso universal à saúde. Foi depois da implementação deste princípio na Constituição de 1988 e na reforma de 1996 que registramos a taxa mais rápida de declínio nas mortes de crianças com menos de cinco anos", afirmou Wang.
Fonte:
BBC BRASIl
http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2011/09/110920_mortalidade_brasil_pu.shtml
IMAGEM
http://contramachismo.wordpress.com/2010/05/29/mortalidade-materna-na-pauta-do-governo-federal/

domingo, 18 de setembro de 2011

Reflexões sobre a não-legalização do aborto e suas consequências



Sim, sim, queridas uterinas, eu sumi. Mas depois de duas longas e atarefadas semanas cá estou trazendo um texto da sempre contundente Lola Aronovitch, autora do blog Escreva Lola Escreva.

Ainda de olho no tema "Maternidade à força" e saindo do terrível capítulo sobre o estupro, é hora de nos depararmos com o fato (e as consequências) de que vivemos em um país onde o aborto é ilegal.

Deixo como sugestão de leitura o texto "MULHER, ESSE SER IRRESPONSÁVEL QUE SÓ QUER ABORTAR". Segue abaixo o trecho inicial. Para ler essa reflexão na íntegra clique aqui
"Espero que os homens que chamem mulheres que abortam de vagabundas e irresponsáveis saibam que 1) essas mulheres não fizeram o filho sozinhas, e 2) se fosse o homem quem ficasse grávido, o aborto seria legalizado. Sério. Não há a menor dúvida disso, porque ninguém ousaria dizer a um homem que seu corpo não é dele. A questão inteirinha do aborto é uma questão sobre o controle do corpo da mulher. Convém pintar a mulher como um ser alterado, nada confiável, fraco das ideias, que precisa ser controlado. Os reaças que são contra a legalização do aborto acreditam que, sendo contra, não existem abortos. Eles somem, pluft, num passe de mágica! Acontece que eles seguem acontecendo, sempre em número maior que em países onde o aborto é legalizado. E abortos ilegais acabam matando a mulher."

Fonte:
texto: http://escrevalolaescreva.blogspot.com/2011/01/mulher-esse-ser-irresponsavel-que-so.html
imagem: http://en.wikipedia.org/wiki/File:Lange-MigrantMother02.jpg

sábado, 3 de setembro de 2011

Quando a taxa de natalidade é mais importante do que a maternidade (e paternidade) consciente



Prefeito sérvio oferece férias românticas a solteiros para estimular nascimentos


Sérvia vem enfrentando declínio de sua população nos últimos 20 anos


O prefeito de uma pequena cidade da Sérvia está propondo uma saída nova e pouco comum para combater o problema da baixa taxa de natalidade no local: ele criou um esquema para enviar 150 homens e 150 mulheres com idades acima de 38 anos para férias pagas na costa da Grécia, na esperança de que a viagem romântica renda o nascimento de mais alguns bebês na cidade.


A Sérvia vem enfrentando o declínio de sua população nos últimos 20 anos, por conta da pobreza, das guerras dos anos 1990 e uma das taxas de natalidade mais baixas da Europa.
Notícias relacionadasEstado da Índia oferece prêmios a casais que aceitarem esterilizaçãoGoverno de Taiwan promoverá encontros entre servidores solteirosCoreia do Sul libera funcionários mais cedo para incentivar procriaçãoTópicos relacionadosGeral, CuriosidadesNas áreas rurais, como no município de Jagodina, o problema é mais grave, com moradores deixando o local cada vez mais em busca de uma vida melhor nas grandes cidades, gerando o temor de que as pequenas comunidades irão simplesmente desaparecer.

O plano do prefeito Dragan Markovic foi lançado com um jantar de apresentação em um restaurante local. Conforme os candidatos foram chegando, eram sentados em mesas numeradas e os cavalheiros recebiam rosas vermelhas para presentear as damas.
Para quebrar o gelo, Markovic fez um discurso de boas vindas. "Estamos enfrentando uma população em declínio", disse. "A cada ano, uma cidade com 25 mil pessoas desaparece na Sérvia", observou.
Ele listou uma série de incentivos que introduziu para combater o problema, incluindo passes grátis de ônibus e material de papelaria, licença-maternidade generosa e pagamentos em dinheiro para novos pais.

"Queremos 30% a mais de nascimentos na cidade do que no ano passado, então estou chamando o evento de hoje de jantar do amor", diz, antes de pedir aos homens que beijem as mulheres. Alguns obedecem.

Bailinho de escola


O prefeito de Jagodina, Dragan Markovic, diz querer um aumento de 30% nos nascimentos


Conforme a noite avançava, um cantor local chegava, abrindo espaço no centro do restaurante para dança, antes de entreter os convidados com canções folclóricas tradicionais.

O evento começava a parecer um bailinho de escola, com os mais autoconfiantes se exibindo na pista, enquanto outros observavam nervosamente enquanto comiam suas saladas de tomate ou suas tortas de maçã.

Mas a resposta à iniciativa da prefeitura pareceu positiva. "Primeiro eu pensei que esse clima romântico criado pelo prefeito era um pouco forçado e artificial", afirmou Ana Zdravkovic. "Mas agora estou achando legal", contou ela.

"A noite está sendo fantástica. Todo mundo está feliz", acrescentou o dentista Predrag Jevdjic. Questionado se já está de olho em alguém, ele respondeu: "Sim, claro, mas ainda estou mantendo o segredo".

O sapateiro Slavoljub Tanaskovic se disse animado com as perspectivas. "Uma mulher veio à minha mesa e me disse que eu tinha olhos bonitos", disse ele com um sorriso. "Todos os homens ao meu lado ficaram com inveja. Sei que vou ter algo com ela na Grécia - eu posso sentir", garantiu.


'Truque barato'


Viagem dos solteiros à Grécia será paga pela prefeitura e por patrocinadores privados


A iniciativa do prefeito de Jagodina pode se mostrar efetiva, mas para a ativista de direitos humanos e comentarista Sonja Biserko, não atinge o cerne da questão sobre o problema da população sérvia.


"Esse é um truque barato para chamar a atenção da mídia", afirma. "Atrair jovens com a promessa de férias grátis não é garantia para criar uma família estável. Essa não é a receita que a sociedade deveria oferecer como mecanismo para aproximar os jovens", argumenta.

"É uma forma limitada de combater o problema de uma sociedade em envelhecimento e um país pobre o qual os jovens querem deixar. É só uma substituição para a falta de perspectivas na Sérvia", afirma.


A viagem dos solteiros de Jagodina à Grécia, neste mês, será paga com recursos da prefeitura e também com o apoio de patrocinadores privados, segundo o prefeito. Seus 300 escolhidos estão dispostos a testar sua ideia de cupido ao estilo sérvio, aproveitando também a perspectiva de curtir um pouco de sol e mar.

Em nove meses, será possível se ter uma ideia se a iniciativa é somente uma tentativa de engenharia social vinda da cabeça de um prefeito com dinheiro em caixa e em busca da reeleição ou uma ideia altruísta para ajudar os cidadãos de Jagodina a encontrarem o amor.




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